
A história da imigração japonesa no Brasil é essencialmente essa: a de um país necessitado de mão de obra, abrigando gente que, por alguma razão – seja guerra ou crise demográfica –, prefere deixar sua pátria. É uma história em que os brasileiros entraram com sua hospitalidade e flexibilidade, e os japoneses, com trabalho e disciplina. Acontece que a saga dessa colônia deu tão certo que, com o tempo, a equação já não se limitava a ser essa. As gerações passaram, e os imigrantes se incorporaram tanto que logo havia japoneses sendo mais brasileiros do que os próprios brasileiros. Às vezes até no futebol.
Pense hoje em Ronaldinho: o drible do elástico – em que começa a levar a bola para um lado, com a parte de fora do pé, e, no meio do caminho, a puxa para o outro. De onde o gaúcho o tirou? De Roberto Rivellino, certo? Nada. A patente é de Sérgio Echigo, um nisei, filho de imigrantes japoneses, que jogou no Corinthians na década de 60. “Num treino dos aspirantes, ele dominou uma bola na lateral e fez aquilo. Jogou o Eduardo, um zagueiro nosso, quase para fora do campo”, recontava Rivellino anos depois. “Olhei para ele assustado: ‘Japonês, o que é isso que você fez?!’ E ele, então, me ensinou. A única coisa que o Echigo diz é que o elástico quem inventou foi ele, mas eu que aperfeiçoei”, brinca o campeão mundial da Copa do Mundo da FIFA de 1970 com o Brasil.
E vice-versaE, se no futebol, afinal, a imigração japonesa podia acabar resultando em drible novo, a via contrária, a emigração brasileira para o país asiático, também não precisaria se limitar à exportação de talento e criatividade. Quer dizer, claro que em 1991, quando o Kashima Antlers escolheu Zico para ser seu grande embaixador – seu e de toda a incipiente J.League –, a principal razão para isso era o fato de que o brasileiro jogava muita bola. Mas também aí os dois lados se sentiram tão à vontade que a contribuição acabou se estendendo. Se hoje o brasileiro tem duas estátuas e um minimuseu seus em Kashima, é também por sua ajuda naquilo por que o Japão mais é conhecido: rigor e organização.
“Eu sabia que eles queriam que eu jogasse, mas não sabia se podia. Deixei claro que, aos 38 anos, estava parando e tinha intenções de fazer mais. O pensamento era o de dar uma contribuição na transformação do futebol amador para o profissional e, em função de o meu próprio temperamento ir ao encontro da cultura japonesa – de disciplina, superação, determinação – as portas foram se abrindo e conseguimos desenvolver muito todo o futebol do país”, conta Zico ao FIFA.com. “No final, só me tornei técnico da seleção japonesa (em 2002, até 2006) por eles; pelo povo. Os japoneses foram sempre tão gratos a mim que não podia negar. Passei a viver experiências do dia a dia - fora do campo, da cultura mesmo – que me deixaram numa situação muito confortável no país. Foi a melhor experiência possível para começar minha carreira de treinador.”
Minha pátria, sua pátria
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